"DE FORA PARA DENTRO"
Sendo um hino ao inconformismo, à ironia e à insubmissão, publico, com a devida autorização, esta carta dirigida pela Ana Anes - até há pouco tempo colaboradora do Expresso - a Henrique Monteiro, director do referido semanário:
Paço d’Arcos, entre Maio e Julho de 2006 num edifício envidraçado de uma grande “Media Corporation”, no Portugal dos Pequeninos
Queridos Amigos aí de outras bandas,
Pois cá estou eu, aparentemente no “pico do sucesso” ,que, qualquer maçarica que começou a escrever por brincadeira poderia desejar. Aquela frase dos yuppies , “I have it all” ( juntando, uma “sou fabulosa, porra!”), é aquilo que todos pensam... visto de fora,
Obviamente que ao contrário dos Tugas-normais não sou pobre e mal agradecida, nem como diz o José Castelo Branco “ não mordo a mão que me dá de comer”, mas como tuga-atípica que sou não podia deixar de vos contar as “latest” vistas de dentro deste edifício envidraçado que, lá fora muito boa gente, gostaria de “habitar” (não fossem eles saber como é por dentro). Ora, vejamos: 1- pensava eu, que a minha experiência autárquica tinha sido única e sem igual e irrepetitível. Enganei-me, pois claro está. Este edifício envidraçado onde habito um dia por semana, é igualzinho a uma autarquia, com um diferença apenas: As autarquias, essas, já toda a gente sabe que estão podres por dentro e por fora, cheias de pessoas que não fazem nem querem fazer “la pointe d’un corne”- como dizem os emigras portugueses- com vetos de gavetas a torto e a direito, bloqueios em reuniões de câmara, cheios de gente mal amada ( para não dizer outro “mot”), frustrada que adoraria estar a fazer outra coisa- mas não se muda, porque nós, grandes tugas, temos o “Gene do Conformismo”- mas não faz, porque, ali tudo parou no tempo. Adoram resistir à mudança e aos agentes portadores de algum tipo de mudança, aka, “alvos a abater”. A diferença entre estes dois sítios, amiguinhos aí de fora, é que este edifício envidraçado é apenas e somente uma autarquia disfarçada de business center, com um hall brutal que apela à modernidade, à abertura de espirito, que por acaso, acaba, no momento em que pomos os pés nos benditos andares desta obra de arquitectura que mais parece uma nave espacial de tão bonita e brilhante que é. Acham-se espertos os tipos dos media. Acham que pegando numa saloia da Moita, pondo-lhes extensões, fazendo-lhe um bom “facial” e vestindo-a com roupas de griffe, ela se transforma numa Mona Aihoub. Pois é, o resultado está à vista. As pessoas são as mesmas que as duma autarquia com um pequeno “senão” de maior: São mais mesquinhas, mais ciosas do seu espaço, porque afinal, neste edificio envidraçado, às vezes há mudanças e o lugar não é para a toda a vida, ao contrário das autarquias. Por isso, amigos, eu, que não sabia como tinha sido o tempo de Salazar- sempre ouvi falar muito na caneta azul e isso muito me intrigou- agora fiz uma viagem no tempo e estou a vivê-la, qual filme de ficção cientifica. As pessoas desta nave espacial vêem dum planeta que se chama “ nós não temos, não sabemos e temos raiva de quem sabe o que é sentido de humor”. Salvo, raras excepções- geralmente homens, perto da geração do meu pai- que já perceberam que sou uma ave rara metida num comboio do zombies e que me ajudam neste filme onde o cenário até é bem escrito, mas há erros de castings aos pontapés, todas as segundas feiras me apetece colar em tudo quanto é sitio ( de vários andares) papéis tipo “ DÃO-SE WORKSHOPS DE COMO VIVER BEM CONSIGO PRÓPRIO”, pondo o tlm de algum cargo da direcção nos mesmos panfletos, para a coisa ficar mais gira. Obviamente, não iria resultar. Porque estas pessoas, só mudarão para pior, como bons tugas mal amados que são.
E perguntam vocês, amigos de fora, porque raio aceitei este “ride” e continuo neste “Poseidon”? É simples. No país da tuguice, como boa utópica que sou, achei à semelhança de quando entrei na tal autarquia que ia mudar o mundo e deixar a minha impressão digital, mas também, porque tristemente, neste país sem humor de jeito, é preciso passar por “sítios de referência”- como dizem amigos, família e colegas- para não se passar por doida e ser levada a sério.
Obviamente, que eu sou uma ave em plena época de caça. Mas rio-me, ou não fosse eu. Porque já nada me surpreende, e a estupidez humana dá-me vontade de rir, porque as lágrimas têm destinos mais dignos.
E, o que eles não sabem, quando estão a meter os cartuchos nas caçadeiras antes de fazer pontaria a este pardal- que bem se esforça por ser transparente- é que eu não sou de lá, nem venho para ficar. Sou uma planadora, assim, tipo àguia, mas do Belenenses. Um clube pequenino, que de vez em quando dá os ares da sua graça aos maiores. E é por estas e por outras que estes estranhos caçadores se sentem tão ameaçados com um... simples pardal.
Comendadora Ana Anes
8.7.2006
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